TRANSATRAVESSADOS

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29 de agosto de 2013

Bushido

Emboscar a rima, 
lago que transborda, 
é atravessar por cima 
como quem não acorda. 

Para forjar adorno ardente, 
forno, fole, martelo, bigorna. 
Para que lhes degole em duelo 
imerso em estocar pela frente 
o verso do que se entorna... 

Na batalha, enfoca a aorta: 

Aço de espada fria, 
antes esquenta 
para esfriar 
o que 


13 de junho de 2013

Consolação 13/06/2013 (lacrimogênea)

Há certos paulistanos 
que, fartos de patrão, 
não esperam milagre 
para gases mundanos, 
e preparados estarão 
se o caos se deflagre: 
são videntes urbanos, 
vêem bem a situação, 
têm olhos de vinagre. 

23 de maio de 2013

en prise


para dois pontos numinosos
para um lance raro no dia escuro
para que o silêncio seja sua captura
para as suas noites despidas de ludo
para que peças de madeira feitas
para se abraçar em uníssono
bastam só dois dedos de amor no abismo
e se desvendam suas duas estrelas de anis
alcança de súbito o interior
segue adiante sem dons de ver
para à plebeia morte ser promovida
se mesmo as maestrias macias de segunda
tem a tara de pau de árvores genealógicas
de cujas copas os teus óleos se derramam
vistos desde o inaudível húmido solo
encastelado no sudoeste da hora
a cada gota ainda mais queda
um lençol encobria o céu em sonho a pino
e tão recorrente destino não há hoje em dia



1 de fevereiro de 2013

Três Gatos

Gato e Rato 

Rato na terra ao gato 
Que tem boa vontade 
Que usa bem o olfato 
Rumo a sua saciedade 

Visa além do que vê 
Ao cobiçoso enxergar 
Ao fugitivo que prevê 
Vir a ser felino paladar 

Que morreria de leptospirose 
Aquele gato faminto não sabia 
Aquele rato só sabe da psicose 
Que sente morrendo de gatofobia 

Gato e Peixe 

O peixinho na água do aquário 
Sem saber que era visto de fato 
Todo o perigo seria imaginário 
Não o visse ambicioso o gato 

O felino que desdenha do banho 
Mas arrisca-se por uma boa presa 
Um meio vale se o fim é o ganho 
Só lava a garra que usará à mesa 

No chão a seus pés o peixe engatinha 
Agonizando sem ar por ter sido fisgado 
Um dos dois vai virar só uma espinha 
Um dos dois vai se revirar engasgado 

Gato e Pássaro 

Um passarinho no ar planava 
Sonhava baixo em seu rasante 
O pensamento do gato se alçava 
A como ficar da comida diante 

Subiu o felino ao galho mais alto 
Em silêncio escondido na árvore 
Pondo-se alerta para o maior salto 
Ao apanhar a ave que bem a devore 

No pulo o gato recheia o que estava vazio 
Sem discussão está no papo o filé 
Engaiolada no gato ela dá seu último pio 
Sem asas nem sempre se cai de pé 


18 de janeiro de 2013

Para quê?




Para estar inquieto ao termo da iniciação

a que teus escravos olhos me submetem.

Para que com o curto fio da liberdade

tu possas fazer corrediços

laços de vontade.



Para que as regras que falo

deixem de ser o fluxo

do meu idioma.

Para encontrar até a última interdição

e perdê-la na tradução.



Para que os que sabem dividir

não abram mão do resto.

Para separar de uma vez as famílias tão perfeitas

que prescindem de alguém

infamiliar tal qual tu.



Para compartilhar os dois silêncios

entre tu e tu

com o outro alguém além de mim.

Para que os mistérios contenham livros

que se atenham àquilo que os contém.



Para aliviar os egoístas

de suas próprias mortes.

Para que nossa idolatria do erro

remende com ouro

as cerâmicas rachadas da fidelidade.



Para que tombem

as almas das quais qualquer benzedeira

extrai um encosto.

Para forjar talismãs

mais inúteis do que os que nos salvam.



Para que os espelhos sejam torturados

até pararem de nos hipnotizar com a verdade.

Para abraçar a penúltima solidão

quando ela nos reivindica

só para si.



Para iluminar com gritos de orgasmo

os quartos dos idosos

que a escuridão faz dormir.

Para que todas as línguas cultas

convertam em práxis seus clitóris.



Para desengavetar as mil lágrimas

cujo pó habilita para a publicação.

Para que as crueldades

que desatamos a dizer

sempre ecoem em nós.



Para que outra juventude ainda queime

as horas grossas de alho e sal

que me alimentam.

Para fazer chegar estas palavras

aonde não chegam as formigas.



Para que os que desmaiam com susto

sejam beijados pelo que os assombra.

Para matar quem morre

de medo de temer

sua coragem.



Para emendar a minha constituição tão frágil

diante da reserva do possível

e garantir mais do que um mínimo existencial.

Para que o que mais se deseja em juízo

seja preciso.



Para nunca nos esquecermos de quanto viemos

ou para quando vamos.

Para que a criança do futuro

suspeite que os brinquedos de presente

não tem passado de arma.



Para que nos dê o álcool

cada vez mais barato

cobiçado de cara.

Para desengarrafar o que só se liquida

com uma dose de sede. 



Para que os muros sirvam de páginas

cuja razão sempre está do outro lado.

Para deixar crescer os cabelos

como se a sobejar os sistemas

que emaranharão as cabeças.



Para esmolar uma boa maldade qualquer

a quem quero tanto ou encarecidamente

amo.

Para que a nossa valorosa paixão

custe o apreço pela própria alma.



Para conferir o sangue dos sonhos

que a consciência prefere.

Para que lágrimas como punhos

por efeito físico ou causa moral

deem pancadas de chuva no céu dos astrólatras.



Para que o sexo como nós conhecemos

nunca deixe de gerar as estranhas forças

que continuamente desperdiça.

Para acelerar com novos nadas

o suplício lento do mesmo tédio.



Para que mesmo sem causa

tudo surta efeito.

Para asseverar que em tais frenesis

de princípios nomeio sempre

antes esse fim que ri.



Para que as derradeiras respostas

de nosso escasso estoque

reponham lá as questões.

Para que todavia se indague

para quê. 





10 de janeiro de 2013

Resoluções de (ano) novo




Não me deprimir com tudo aquilo que normalmente alegra
Jogar muito xadrez, adotar um gato preto e não pensar em viajar
Chorar menos, exceção aos Bergmans que confirmam a regra
Ganhar algum dinheiro, nem que para isso seja preciso trabalhar

Ir mais ao teatro, não ir menos ao cinema, ou reciclar relógios
Fumar apenas depois de comer e comer com mais frequência
Ser menos territorialista, dividindo meu espaço em episódios
Parar com as aventuras e tentar suicídios com mais prudência

Beber água e dormir, para dar uma variada ou mesmo sobreviver
Arriscar-me a discordar de Nietzsche, Cioran e Schopenhauer
Nunca perdoar e nunca capitular, e, sempre que possível, esquecer
Aliviar nos assuntos, sem no entanto incorrer no Flower Power

Nunca deixar a cor me distrair da profundidade em Van Gogh
Fotografar somente em P&B para enxergar mais com menos cores
Deve ser urgente reler Huidobro, reouvir Monk, rever Herzog
Afastar-me das criaturas que costumam se aproximar de criadores

Escrever menos e ler menos ainda, e, falar e ouvir, jamais
Legar à posteridade uns quinhentos nus frontais, enquanto duro
Amar mais através do sexo do que foder amando demais
Evitar relacionamentos à distância, sobretudo com os do futuro